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Letras: com todas as LETRAS


O Primo Basílio

Análise dos personagens secundários Julião e Sebastião.
Estudo sobre o tempo: quando se passa a ação, quanto dura a ação e ordem cronológica.
Estudo sobre o Foco narrativo: as modalidades do foco, o discurso das personagens, a subjetividade do narrador.

Por Isabel Amadeu, Mayra Rossini, Silvana das Neves e Annie Baracat - UNIP

Análise dos Personagens:

Julião Zuzarte: Era parente de Jorge e havia sido seu colega de estudos nos primeiros anos da Politécnica.

Era um homem seco e nervoso. Tinha curso de cirurgião, mas mesmo assim, estudava muito. Aos 30 anos ainda era pobre, não tinha clientes, estava cheio de dívidas e cansado de sua “pobreza”. Tinha grande inveja daqueles que julgava medíocres, pis via-os ascender.

Havia tido a oportunidade de aceitar fazer parte de um partido da Câmara, mas como era muito orgulhoso não quis colocar de lado a ciência e passar a viver num lugar provinciano.

Almejava um dia ser rico, ter uma boa  clientela e uma mulher com grande dote.

Mostra-se durante a narrativa, insensível, orgulhoso, invejoso, prepotente. Apesar de Jorge considera-lo grande amigo, não se importa com os problemas que o rodeiam. Prova disso é o trecho que se segue:

Aquele mutismo afetou Sebastião. Disse com desconsolação:
       -- Homem, vim-te pedir um conselho...
       --Mas que diabos queres tu? – E a voz de Julião irritava-se. – A culpa é dela! É dela! – insistiu, vendo o olhar de Sebastião.—É uma mulher de vinte e cinco anos, casada há quatro; deve saber  que se não recebe todos os dias um peralvilho, numa rua pequena, com a vizinhança a postos! Se o faz, é porque lhe agrada.

Sebastião: A personagem se caracteriza como sendo a antítese de Julião. Eça de Queiroz o descreve assim: ...O seu rosto, em plena luz, tinha uma expressão honesta, simples, aberta: os olhos pequenos, azuis dum azul claro, duma suavidade séria, adoçavam-se muito quando sorria: e os beiços escarlates sem películas secas, os dentes luzidios, revelavam uma vida saudável e hábitos castos. Falava devagar, baixo, como se tivesse medo de se manifestar ou fatigar.

 

            Mostra-se sempre honesto, simples, justo fiel. Preocupava-se com a reputação de Luisa e Jorge. É consciente em relação as diferenças sociais e a discriminação sofrida pelas mulheres. Prova disso é que diz a Luisa quando esta lhe conta sobre o adultério, que o que existe são “homens maus , e não mulheres más”. Diante disso, podemos concluir que Sebastião considera Luisa uma vítima do poder de sedução de Basílio.

            Apesar da personagem mostrar certa meiguice, o episódio em que recupera as cartas que comprometem Luisa, mostra-o forte, determinado e consciente de seus atos. Em alguns trechos da narrativa é possível perceber por parte de Sebastião um amor platônico por Luisa. Isso torna-se mais evidente, também no trecho em que Luisa conta-lhe sobre o adultério e este ao ouvi-la põe-se a chorar.

Estudo do tempo:

Quando se passa a ação: A ação dura em torno de um ano, setembro de 1876 a setembro de 1887. A história é contemporânea à época em que foi escrito o livro.

Eça de Queiroz, através de sua obra, visava criticar os costumes da época, levando para suas obras aspectos do cotidiano.

            A trama se passa num momento em que os costumes franceses influenciavam os costumes portugueses. Prova disso, são os termos muito utilizados por Eça de Queiroz: soutache (pág. 15), coupé (pág. 21), e até mesmo a citação do autor, de personalidades da época: Alfred de Murret (pág. 16), Delacroix (pág. 25)

 

Quanto dura a ação: A  narrativa desenrola-se no período de aproximadamente seis meses. Não há como fazer precisão exata do tempo. É possível perceber, que a trama se inicia no verão. Como exemplo temos:

Era em julho, um domingo; fazia um grande calor; as duas janelas estavam cerradas, mas sentia-se fora o sol faiscar nas vidraças, escaldar a pedra da varanda; havia o silêncio recolhido e sonolento de manhã de missa; (...)

            Já o desfecho da narrativa, dá-se no outono, período entre a doença e morte de Luisa.

Veja o trecho abaixo:

            Basílio não respondia. Desde que chegara a Santa Apolônia, recordações do Paraíso, da casa de Luisa, de todo aquele romance do verão passado, começavam a voltar, a atraí-lo, com um encanto picante. Fora encostar-se à vidraça. Uma lua fria, lívida, corria agora entre grossas nuvens cor de chumbo: às vezes uma grande malha luminosa caía sobre a água, faiscava; depois tudo escurecia; vagas mastreações desenhavam-se na obscuridade difusa; e algum fanal de navio tremeluzia friamente.

 

            A narrativa desenrolou-se entre duas estações: o verão e o outono. NO verão o autor refere-se ao período intenso da paixão entre Luisa e Basílio, as tardes de amor, as loucuras, as champagnes etc.

            Na transição de uma estação para outra, coincide a desilusão e sofrimento de Luisa. Sua doença e morte coincide com o frio do outono, ou seja, Eça de Queiroz, junta ao verão a paixão efêmera e ao outono, a morte.

 

Ordem cronológica: A história é narrada segundo a ordem começo-meio-fim. O recuo ocorrido com a personagem Luisa é de aproximadamente sete anos.

            Além de facilitar a compreensão dos antecedentes da ação, esta retrospectiva temporal nos ajuda a caracterizar as personagens.

Vale ressaltar, que tais retrospectivas, são características do romance realista-naturalista, e tornam a narrativa lenta. Vejamos os exemplos:

Lembrou-lhe de repente a notícia do jornal, a chegada do primo Basílio...

       Um sorriso vagaroso dilatou-lhe os beicinhos vermelhos e cheios.— Fora seu primeiro namoro, o primo Basílio! Tinha ela então dezoito anos! Ninguém o sabia, nem Jorge, nem Sebastião...

        Tinham passado três anos quando conheceu Jorge. Ao princípio não lhe agradou.

  Estudo do Foco Narrativo

Discurso das personagens: O discurso predominante na narrativa é o indireto livre, aquele que mistura a fala do narrador com a do personagem. Eça de Queiroz, utilizava-se muito desse discurso por não gostar de utilizar verbos de elocução, e para aproximar a linguagem literária da língua falada. Prova disso é o trecho que se segue:

            Pelas três  horas da tarde, Juliana entrou na cozinha e atirou-se para uma cadeira, derreada. Não se tinha nas pernas debilidade! Desde as duas horas que andava a arrumar a sala! Estava um chiqueiro. O peralta na véspera até deixara cinza de tabaco por cima das mesas! A negra é que as pagava. E que calor! Era de derreter! Ufa!

Outro exemplo:

            Que noite para Luisa! A cada momento acordava num sobressalto, abria os olhos na penumbra do quarto, e caía-lhe logo na alma, como uma punhalada, aquele cuidado pungente: Que havia de fazer? Como havia de arranjar dinheiro? Seiscentos mil réis! As suas jóias valiam talvez duzentos mil réis. Mas depois, que diria Jorge? Tinha s pratas... Mas era o mesmo!

 

Vale a pena falarmos sobre os outros dois discursos presentes na narrativa: o discurso direto e o discurso indireto.

Discurso direto: Neste discurso os diálogos das personagens são reproduzidos fielmente. Vejamos o trecho abaixo:

 

Luisa pôs-se a rir:

-- Por um marido? Acho barato...

-- E se a sorte falha?

-- Então é caro!

 

Discurso indireto: É aquele em que o narrador conta com suas palavras aquilo que a personagem disse. O emprego desse discurso, é raro na narrativa, porque é a forma que mais se distancia da reprodução exata das falas das personagens. Vejamos o exemplo:

O sr Brito saíra logo de manhã cedo, disse o porteiro muito azafamado.

Pareceu-lhe que se arrastava uma cadeira, depois que se fechava uma vidraça. Os olhos faiscavam-lhe. Uma risada de Luisa sobressaiu; em seguida um silêncio; e as vozes recomeçaram num tom sereno e contínuo. De repente o sujeito ergueu a fala, e entre as palavras que dizia, de pé decerto, passeando, Juliana ouviu claramente: Tu, foste tu!

 

Modalidades do foco narrativo: A narração na obra, faz-se em 3ª pessoa, e existem duas modalidades: a onisciência do narrador e a focalização interna das personagens.

            A onisciência do narrador é aquela em que o mesmo observa e não participa da história. Ele sabe tudo sobre a personagem, suas características, seus costumes além de contestar os valores morais das mesmas. Veja:

 

            Tinha cinqüenta anos, era muito nutrida, e, como sofria de dispepsia e de gases, àquela hora não se podia espartilhar e as suas formas transbordavam. Já se viam alguns fios brancos nos seus cabelos levemente anelados, mas a cara era lisa e redonda, cheia, de uma alvura baça e mole de freira; nos olhos papudos, com apele já engelhada em redor, luzia uma pupila negra úmida, muito móbil; aos cantos da boca uns pêlos de buço ´pareciam traços leves e circunflexos de uma pena muito fina. Fora a íntima amiga da mãe de Luisa, e tomara aquele hábito de vir ver apequena aos domingos. Era fidalga, dos Noronhas de Redondella, bastante aparentada em Lisboa, um pouco devota, muito da Encarnação.

 

            A focalização interna é a narrativa feita do ponto de vista da personagem. O leitor só sabe aquilo que a personagem sabe. Em nenhum momento há a interferência do narrador e dessa forma os acontecimentos da narrativa são mostrados ao leitor e não resumidos, como acontece na narração onisciente. A narrativa assim, torna-se objetiva, característica do romance realista-naturalista.

            Na obra é predominante a focalização interna de Luisa, seguida depois pela de Basílio, Juliana, Joana e Sebastião, em menor número.

            É através da focalização interna que se conhece a caráter da personagem: a falsidade de Basílio e a ingenuidade de Luisa, por exemplo.

            Em O primo Basílio, os dois tipos de foco narrativo são utilizados, o que faz com que surja uma dicotomia entre as opiniões do narrador e das personagens e entre as próprias personagens. Vejamos os trechos abaixo:

            Luisa olhava-o. Achava-o mais varonil, mais trigueiro. No cabelo preto anelado havia agora alguns fios brancos;mas o bigode pequeno tinha o antigo ar moço, orgulhoso e intrépido; os olhos. Quando ria, a mesma doçura amolecida, banhada num fluído.

 

            Juliana foi-lhe alumiar, furiosa. Olha que propósito, irem duas mulheres sós por aí fora, numa tipóia! E se uma criada então se demorava na rua mais meia hora, credo, que alarido! Que bêbedas!

Subjetividade do narrador: O romance realista-naturalista tem características de objetividade. Nesta narrativa, essa objetividade é quebrada, pois o narrador demonstra seus valores. Fica claro a simpatia que tem por certas personagens (Jorge, Joana), e a antipatia que tem por outros (Juliana, Julião). Prova disso são os trechos abaixo, respectivamente citados:

Fisicamente Jorge nunca se parecera com ela. Fora sempre robusto, de hábitos viris. Tinha os dentes admiráveis de seu pai, os ombros fortes.

(...) Não freqüentava botequins, nem fazia noitadas.

Saltou para o chão, com passadas rijas que faziam tremer o soalho, foi ao jarro, pô-lo  a boca, bebeu uma tarraçada. A camisa justa, feita de pouca fazenda, mostrava as formas rijas e valentes.

       Abriu o postigo que dava para os telhados, para deixar arejar; calçou as chinelas de tapete; e foi ao quarto de Joana. Mas não entro, ficou à porta; era criada de dentro, evitava familiaridades. (...) o seu rosto parecia mais chupado, e as orelhas mais despregadas do crânio; a camisa decotada descobria as clavículas descarnadas; a saia curta mostrava as canelas muito brancas, muito secas.

      O estudante parecia necessitar Deus para explicar o universo. Ma s Julião atacava Deus com cólera; chamava-lhe “uma hipótese safada”, “uma velha caturrice do partido miguelista”! E começaram a assaltar-se sobre a questão social, como dois galos inimigos.

 

 

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